Falando de Mercado: Novo indicador de sebo para exportação

Author Argus

A transformação do mercado de sebo bovino deu um passo decisivo com o recorde de exportações do produto brasileiro. A procura pela matéria-prima também utilizada na rota de biocombustíveis avançados dos Estados Unidos acirra a concorrência com os setores de biodiesel e saboaria, tradicionais compradores da gordura animal. Atenta ao fluxo exportador, a Argus ampliou a cobertura de preços de sebo bovino, lançando uma referência para as cargas embarcadas nos principais portos.

Junte-se a Conrado Mazzoni, chefe adjunto de redação da Argus no Brasil, e Alexandre Melo, repórter sênior da publicação Argus Brasil Combustíveis, e saiba mais sobre os bastidores do desenvolvimento dos preços de exportação do sebo bovino – e as perspectivas para o mercado.

 


Transcript:

CM: Olá e bem-vindos ao ‘Falando de Mercado’ – uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Meu nome é Conrado Mazzoni, eu sou chefe adjunto de redação da Argus no Brasil. E no episódio de hoje estou aqui novamente com Alexandre Melo, repórter sênior da publicação Argus Brasil Combustíveis. Vamos falar sobre o desenvolvimento de indicadores de preços do mercado brasileiro de gordura animal, que fechou o ano passado triplicando o volume de exportação de sebo. Bem-vindo, Alexandre.

AM: Obrigado, Conrado. É um prazer estar aqui novamente, ainda mais para contar sobre essa novidade que trabalhamos desde o começo do ano passado, né...

CM: Que bom, Alexandre, pois é, depois de um longo trabalho de pesquisa e conhecimento junto aos participantes de mercado, conseguimos expandir nossa cobertura de insumos de biodiesel. O indicador de sebo bovino cif São Paulo com impostos está completando 10 anos no relatório Argus Brasil Combustíveis, já bastante conhecido no mercado. E agora ampliamos essa cobertura, levando em conta a transformação que ocorre no mercado brasileiro de gordura animal, com o sebo sendo mais procurado como matéria-prima para biocombustíveis avançados, como o diesel renovável, o HVO, e o próprio combustível de aviação sustentável, o SAF.

AM: Exatamente, Conrado. Aliás, para quem não conhece estamos falando de sebo bovino que é um subproduto do abate de gado. É um resíduo, um produto zero carbon, ou seja, que reduz a pegada de carbono, o que representa um valor muito grande como matéria-prima nas rotas de transição energética como diesel verde e SAF. É um mercado que tem a limitação de crescimento de oferta porque ninguém cria gado para produção de sebo, o sebo é um produto derivado do abate e, portanto, acompanha a dinâmica de rebanho do Brasil. E esse mercado passou a ter entre seus principais consumidores, saboaria e biodiesel, um novo cliente relevante que é a demanda externa. A gente lançou dois novos indicadores nessa cobertura: o sebo bovino fob Mato Grosso diferido, justamente visando capturar o fluxo destinado a biodiesel do maior estado produtor de sebo e acompanhando as mudanças na dinâmica desse mercado desde a entrada em vigor da monofasia tributária que dispersou as faixas de precificação de sebo no País. Vale lembrar aqui, Conrado, que nosso indicador cif São Paulo, que você mencionou, captura o sebo bovino premium, com até 3,5pc de acidez, usualmente destinado à indústria de higiene e limpeza, que é um importante player de precificação do sebo nacional. O segmento de sabão não tem um substituto ao sebo bovino. E, finalmente, para atender a demanda do mercado por uma referência de preço de exportação do sebo brasileiro, a gente lançou o preço fob porto Santos e Paranaguá. Assim como os outros dois indicadores, é um levantamento de preços do sebo para exportação com os custos portuários de disponibilidade no porto, considerando uma acidez máxima entre 4pc e 10pc. Passamos, assim, a fazer a descoberta de preços de um setor de triplicou suas exportações ao longo do ano passado, com destino majoritariamente aos Estados Unidos.

CM: É legal contar esse processo, né, Alexandre, porque a gente percorreu vários caminhos, desde o início do ano passado, antes de chegar nesse resultado. Ouvimos o mercado, participamos de eventos aqui e lá fora, e era cada vez mais evidente que o interesse pelo sebo veio para ficar. Lembro de ter observado na Colômbia, durante o evento Rendering Americas, no ano passado, que compradores de sebo nos Estados Unidos, traders, refinarias, estavam procurando fornecedores no Cone Sul para parcerias de suprimento. E as exportações brasileiras crescendo firmes. A gente costuma comentar aqui, né, Alexandre, para destacar essa transformação que o Brasil era importador líquido de sebo, historicamente, até meados de 2022. O que havia muita dúvida era sobre precificação diante da demanda externa. E naquele momento parecia que a alternativa de aplicar um netback de frete marítimo aos preços do sebo no mercado dos Estados Unidos seria a solução para um indicador, já que estamos falando de um mercado de menor liquidez em comparação com outros mercados que cobrimos. E foi aí que veio sua viagem para Houston, no Texas, certo Alexandre?

AM: Sim, ali foi um divisor de águas, Conrado, porque conseguimos validar junto aos compradores as informações que apuramos com os produtores locais. E ficou muito claro o interesse comprador. Fiquei um mês lá trocando bastante informação com colegas e fontes do mercado de gorduras animais para produção de biodiesel e diesel renovável. Refinarias dos Estados Unidos e Canadá estavam muito interessadas em conhecer fornecedores da América do Sul e, principalmente do Brasil, que é um fornecedor relativamente novo. O que mais interessava para eles era obter garantia de fornecimento em contratos de longo prazo, entender a rota e o custo para levar o produto para os portos e se as plantas de fornecimento são certificadas. E para eles, a informação de desconto de frete não interessava. Eles queriam um price assessment da Argus sobre a precificação do sebo no porto. Estavam muito interessados no modelo de precificação dos insumos e em estabelecer novos contratos porque alguns deles já estão movimentando volumes significativos no Brasil. Tendo isso em mãos, a gente voltou aos participantes aqui locais, né, Conrado, os vendedores, e aprofundamos nosso relacionamento para coletar as informações de preço de sebo fob porto. No fundo, para o lado vendedor, o indicador a partir de levantamento de preços também fazia mais sentido porque capturaria o interesse vendedor na veia, independentemente da precificação do frete marítimo. Como a gente já tinha estabelecido esses contatos há tempos, rapidamente conseguimos avançar e aí construímos a metodologia para essas cargas, a partir das valiosas contribuições dos dois lados da mesa de negociações. E agora esse preço está na rua...

CM: Muito legal, Alexandre. A gente está aqui muito atento ao potencial do Brasil como provedor de matérias-primas para biocombustíveis avançados. E nesse mapeamento de mercados, logo nos deparamos com esse interesse pelo sebo, podendo dar uma contribuição para o desenvolvimento desse mercado de exportação. A gente sabe que na estratégia das refinarias globais o radar vai estar sempre acionado para garimpar a alternativa matéria-prima mais atrativa do momento, ou seja, vai haver uma concorrência entre o óleo de fritura usado chinês, o sebo bovino brasileiro, o óleo de palma da Malásia, dentre outros, mas o Brasil avança nesse tabuleiro global de óleos e gorduras. Com destaque para a forte demanda dos Estados Unidos, os embarques da gordura animal do Brasil para o exterior somaram 246.253t no ano passado, triplicando em relação às 81.350t registradas em 2022. Esses dados são oficiais do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, o MDIC. Aqui vale lembrar que o fluxo maior de gordura em direção aos EUA reflete o incentivo de programas governamentais que premia a molécula renovável no mercado norte-americano. O que nos parece, né, Alexandre, é que a gente não deve ficar repetindo recordes todos os anos, mas dificilmente voltaremos para as 81.000t, então devemos ficar neste ano no meio do caminho entre 250.000t e 81.000t nesse fluxo de exportação. Em termos de preços, começamos o ano meio morno, mas já está esquentando, né, Alexandre?

AM: O ano começou morno nas negociações, com preços caindo em relação aos picos de 2023, mesmo assim vimos saída de um volume importante de exportação em fevereiro, confirmando esse novo normal, vamos dizer assim, em reflexo de contratos de suprimento já firmados. Nas últimas semanas, houve uma reação dos preços de sebo no mercado doméstico e no mercado de exportação, embora neste momento a arbitragem esteja fechada. Depois de um período de muitas consultas de preços, ofertas de compra e venda, nosso indicador capturou uma transação a $1000/t fob porto Paranaguá na semana encerrada em 22 de março. Há uma perspectiva de fortalecimento da demanda por conta do aumento da produção de diesel renovável nos Estados Unidos, o que deve ampliar a importação de insumos. Neste ano, serão cerca de 5,3 milhões de m³ de capacidade adicional, sendo 3 milhões de m³ somente com duas plantas na Califórnia. Já mapeamos que há frigoríficos, graxarias e empresas de reciclagem animal que já firmaram contratos de garantia de suprimento para embarcar produto para o Golfo Americano. Além disso, poderemos observar neste ano os investimentos em tancagem aquecida nos portos começando a sair do papel nos principais portos. Fizemos uma estimativa meses atrás, né, Conrado, com a ajuda da Laura Guedes, do time do relatório Argus Brasil Combustíveis, e apuramos que o armazenamento potencial de tancagem aquecida para óleos e gorduras totaliza 232.000t nos portos brasileiros. Só importante ressalvar aqui que esse número leva em conta espaço que já está sendo utilizado hoje pelo sebo ou também por outros óleos e gorduras. De todo modo, o sinal que ouvimos de operadores logísticos é de maior interesse para aumento de capacidade. Então vamos ficar de olho, Conrado. Aqui no Argus Brasil Combustíveis seguiremos ligados por aqui em como vão se desenrolar os próximos capítulos do mercado de sebo.

CM: Alexandre, muito obrigado pela sua participação, foi muito gratificante tocar esse projeto com você e tenho certeza que em breve voltaremos aqui para atualizar todo esse cenário. Esse e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado. Visite a página para seguir acompanhando os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities e entender seus desdobramentos no Brasil e na América Latina. Voltaremos em breve com mais uma edição do “Falando de Mercado”. Até logo!