O mercado global de GLP vivia um cenário confortável de sobreoferta antes do início da pandemia de Covid-19, mas o arrefecimento na produção de petróleo e derivados mudou drasticamente esta dinâmica.
O que esperar deste mercado a curto, médio e longo prazos? Quais os impactos esperados nos mercados da América Latina?
No episódio desta semana da série Falando de Mercado, Vanessa Viola, Vice-Presidente Sênior da Argus para América Latina, e Clayton Melo, Diretor da Argus no Brasil, fazem um balanço do mercado global de GLP e diante da pandemia de Covid-19.
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Transcrição
Clayton: Olá e bem-vindos ao ‘Falando de Mercado’ – uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos impactando os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Meu nome é Clayton Melo e eu sou o Diretor da Argus no Brasil. Hoje nós recebemos Vanessa Viola, Vice-Presidente Sênior da Argus para América Latina, para falar sobre os impactos da pandemia do novo coronavírus no mercado internacional de gás liquefeito de petróleo, o GLP. Bem-vinda, Vanessa.
Vanessa: Obrigada, Clayton.
Clayton: Vanessa, a pandemia atingiu praticamente todos os combustíveis e no caso do GLP, não foi diferente. Qual foi o principal impacto do Covid-19 no mercado global de GLP?
Vanessa: A gente pode dividir o mercado global de GLP entre antes e depois da pandemia. Antes, a gente viu tanto a produção quanto a demanda crescendo bastante, mas como a produção cresceu a um ritmo mais forte que a demanda, o mercado entrou em período de sobreoferta a partir de 2014 e a expectativa era que essa sobreoferta persistisse pelo menos até o final desta década. A pandemia impactou muito fortemente essa dinâmica e o que a gente espera é que o excedente de produto desapareça e que o mercado tenha na verdade um déficit de GLP.
Clayton: E isso aconteceria já a partir de 2020?
Vanessa: Na verdade, o que a gente espera é que 2020 já apresente um pequeno déficit por conta da queda do nível de utilização das refinarias e a menor produção de petróleo em um período em que a demanda continuou de uma certa forma forte. Entre 2021 e 2023, a gente deve ver o mercado mais equilibrado, quando a taxa de utilização das refinarias deve melhorar e a produção de petróleo deve voltar a subir. E, a gente poderia ver um déficit novamente a partir de 2024 provocado pela redução de investimentos em petróleo e gás natural e em um ambiente em que a demanda seguiria crescendo. Ou seja, a gente passaria de um mercado favorável a importadores antes da pandemia a um mercado mais desfavorável a importadores pós pandemia, se as atuais condições de mercado forem mantidas.
Clayton: Esse impacto deve ser sentido na América Latina também? Vanessa: Tradicionalmente, a América Latina tem sido um importador de GLP há várias décadas e isso não deve mudar. Antes da Covid-19, a expectativa era de que o déficit latino-americano de GLP permanecesse em torno de 8-9 milhões t, mas nossa equipe de consultoria revisou a previsão e agora a expectativa é de que o déficit poderia crescer para algo em torno de 11 milhões ao longo desta década.
Clayton: Você mencionou algumas vezes um crescimento do consumo de GLP durante a pandemia, algo bem diferente do que a gente viu com outros combustíveis, especialmente gasolina e querosene de aviação. No caso do GLP, o que impulsionou esse aumento e o que a gente pode esperar daqui pra frente em relação à demanda?
Vanessa: A pandemia impactou a produção de GLP de uma forma bem uniforme globalmente, mas o impacto na demanda foi bem mais variado, dependedo de cada região/país e setor. O GLP na verdade tem se mostrado um combustível bastante resiliente durante a pandemia, especialmente em países onde o GLP é amplamente usado pelo setor residencial como Brasil e Índia. Com mais gente trabalhando em casa, com mais restrições de movimento, as pessoas passaram a cozinhar mais em casa e isso impulsionou o consumo de GLP em certas regiões. Em outros países, onde existe uma forte competição com gás natural ou onde o GLP é mais usado como combustível em veículos ou nos setores industrial/comercial, a demanda caiu. E no caso do setor petroquímico, o valor do GLP em relação à nafta subiu muito no trimestre passado, fazendo com que as empresas do setor usassem mais nafta como matéria-prima para a produção de plástico. Mas a relação entre o preço do GLP e da nafta já voltou a padrões mais normais e a gente deve começar a ver uma recuperação na demanda petroquímica por GLP. Há novas plantas petroquímicas que devem entrar em operação na Ásia nos próximos meses e a gente deve ver um aumento na demanda de GLP naquela região.
Clayton: A América Latina é estruturalmente deficitária em GLP e tipicamente importa produto dos Estados Unidos, que se converteram no maior exportador de GLP do mundo. Essa dinâmica deve mudar?
Vanessa: O volume de GLP que os EUA exportam para a América Latina se manteve estável nos últimos anos. O que mudou, e é uma mudança muito importante, é que a América Latina começou a competir com a Ásia por produto dos EUA - no passado, 50% das exportações dos EUA eram destinadas à América Latina e agora esse percentual caiu para um 25%. E isso significa que é muito importante que importadores da América Latina entendam o que está acontecendo nos mercados que competem com a América Latina, especialmente a Ásia. Quando um exportador americano tem uma carga para exportar, a primeira coisa que ele analisa é quanto a Ásia está pagando. Portanto, os exportadores americanos determinarão seu preço de venda para a América Latina com base no preço que a Ásia pagaria por sua carga de GLP. E, embora os exportadores americanos continuem vendendo suas cargas com base no indicador de preço do mercado americano (Mont Belvieu), a conta que eles fazem é preço da Ásia (Argus Far East Index) menos o frete entre Mont Belvieu e Ásia para determinar o ponto de partida que vai ser usado nas negociações com a América Latina.
Clayton: E o que a gente deve esperar em relação ao comportamento dos preços em Mont Belvieu no curto prazo diante do cenário atual?
Vanessa: Os cortes na produção de gás associado nos EUA durante o primeiro trimestre ajudaram a aumentar os preços do propano americano, apesar da queda nos preços do petróleo. Atualmente, o preço do propano em Mont Belvieu está em torno de 48% do valor do WTI, acima dos 35% de um ano atrás. A recuperação da produção de petróleo e gás na bacia das Permian no segundo trimestre está pressionando os preços em Mont Belvieu e ajudando a manter a arbitragem aberta para a Ásia. Olhando para os próximos meses, a expectativa é de que os preços da nafta na Ásia se recuperem, o que ajudará a aumentar a demanda petroquímica de GLP e, juntamente com o aumento da demanda sazonal no hemisfério norte, poderá provocar um aumento gradual nos preços mundiais de GLP, o que deve impulsionar Mont Belvieu nos próximos meses.
Clayton: Muito obrigado, Vanessa.
Se você quiser saber mais sobre os impactos da pandemia no mercado global de commodities, acesse nosso microsite dedicado ao assunto em www.argusmedia.com/coronavirus. Voltaremos em breve com mais uma edição do Falando de Mercado. Até logo!