Apesar da safra histórica de soja registrada no Brasil este ano, a elevada demanda durante a pandemia tem impulsionado as importações do grão a níveis recorde e ajudado a reequilibrar a balança comercial do produto.
O que há por trás deste movimento e quais mercados poderão se beneficiar a curto e médio prazo?
No episódio desta semana da série Falando de Mercado, Camila Dias, chefe de redação da Argus no Brasil, conversa com José Roberto Gomes, repórter de agricultura e fertilizantes, sobre a mudança na balança comercial da soja brasileira.
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Transcript
Camila Dias: Camila Dias: Olá e bem-vindos ao ‘Falando de Mercado’ – uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Meu nome é Camila Dias, chefe de redação da Argus no Brasil. E no episódio de hoje eu converso com José Roberto Gomes, repórter de Agricultura e Fertilizantes da Argus, sobre o aumento das importações de soja pelo Brasil. Bem-vindo, José Roberto.
José Roberto Gomes: Oi, Camila, e obrigado. Um prazer estar aqui.
Camila: José, o Brasil colheu uma safra recorde de soja neste ano e, mesmo assim, tem importado volumes crescentes da commodity. O que justifica isso?
José Roberto: Pois é, Camila. A produção brasileira de soja foi histórica em 2020, com quase 125 milhões de toneladas, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab. Mas a forte desvalorização do real em relação ao dólar ao longo deste ano tornou a soja produzida no Brasil ainda mais competitiva no mercado internacional, além de elevar os preços internos e estimular vendas pelos agricultores.
O resultado? Exportações muito aquecidas até agora neste ano, o que enxugou os estoques internos do produto. E daí surgiu a necessidade de se importar mais, até porque temos um consumo doméstico ainda firme apesar da pandemia de Covid-19, principalmente para fabricação de ração animal e utilização na indústria de biodiesel. E, Camila, vale lembrar, né? Estamos falando de importação de soja pelo maior produtor e exportador mundial da commodity.
Camila: É verdade, não deixa de ser algo irônico. José, como está, então, esse balanço de exportação e importação de soja pelo Brasil?
José Roberto: Olha, Camila, pelos dados mais recentes do governo, o Brasil exportou de janeiro a julho cerca de 70 milhões de toneladas de soja, volume recorde para o período, tendo a China como principal importador. A oferta cada vez mais escassa por aqui fez com que os prêmios de exportação de soja se aproximassem de 2 dólares por bushel no paper market de Paranaguá, onde tradings negociam volumes para exportação. Pra você ter uma ideia, é o maior nível desde 2018, quando Estados Unidos e China estavam no ápice da guerra comercial e Pequim impulsionou as compras de soja brasileira.
Do lado da importação, os volumes também chamam a atenção. Foram importadas quase 400 mil toneladas de janeiro a julho, a maior quantidade para esse período desde 2014. Pode parecer pouco, mas é expressivo, já que, de novo, estamos falando do maior produtor global da commodity. A expectativa é de que esse número aumente nos próximos meses, pois o Brasil só terá oferta própria novamente a partir de janeiro, com a colheita da safra 2020-2021.
Camila: Há alguma previsão para as importações totais de soja pelo Brasil em 2020?
José Roberto: Analistas e outros agentes do mercado avaliam que o país poderá importar em torno de 1 milhão de t para suprir as necessidades internas. Se isso se concretizar, será o maior volume desde 2003, quando importamos 1 milhão e 200 mil toneladas.
Camila: José, de onde vem essa soja importada pelo Brasil?
José Roberto: A maior parte vem do Paraguai, que registrou uma safra razoável neste ano, de cerca de 10 milhões de toneladas. Mas é um país pequeno, com uma demanda local bem menor que a brasileira e, portanto, tem excedentes para enviar ao Brasil. E a negociação é facilitada pelo fato de ambos os países fazerem parte do Mercosul, sem incidência de tarifas nessas vendas.
Essa soja paraguaia acaba tendo o Paraná como principal destino, até porque o estado faz fronteira com o Paraguai, e isso facilita muito a logística de transporte.
Camila: Recentemente, o governo brasileiro disse que estuda facilitar a importação de soja de países de fora do Mercosul. Como está essa discussão?
José Roberto: Pois é, Camila. Essa ideia apareceu no fim de agosto e envolve não só soja, mas também milho e arroz. Hoje, há incidência de uma tarifa de 12 por cento sobre o arroz e de 8 por cento sobre a soja e o milho importados de países não pertencentes ao Mercosul.
O objetivo do governo é eliminar essas tarifas, incluindo as três commodities em uma lista de exceções, a chamada Letec. O governo afirma que a medida tem caráter puramente de prevenção, já que não há necessidade imediata de importações volumosas desses produtos.
A ideia será formalmente analisada pelo governo em setembro. E, caso seja aprovada, pode beneficiar um importante exportador de commodities: os Estados Unidos. Vamos aguardar, né?
Camila: Vamos acompanhando por aqui como evolui essa discussão. Muito obrigado, José Roberto.
Este e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado. Visite a página para seguir acompanhando os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities e entender seus desobramentos no Brasil e na América Latina. Voltaremos em breve com mais uma edição do Falando de Mercado. Até logo!