Falando de Mercado: O início do mercado do gás aberto no Brasil

Author Argus

Com o início da abertura do gás natural no Brasil este ano, já é possível ver o reflexo da competição sobre os preços.

Junte-se a Camila Dias, Diretora da Argus Brasil, e Flávia Pierry, Editora de Gás Natural e Energia. Elas falam sobre os primeiros resultados após a abertura.

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Transcript

[Camila Dias] Olá, e bem-vindos ao Falando de Mercado, uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo.

Meu nome é Camila Dias, eu sou chefe de redação da Argus no Brasil, e no episódio de hoje eu converso com Flávia Pierry, editora de Gas Natural e Energia, sobre os primeiros resultados da abertura do mercado de gás natural no Brasil e o fim do monopolio da Petrobras no setor. Bem-vinda, Flavia.

[Flávia Pierry] Obrigada, Camila.

[Camila] Flávia, desde 2016 o setor de gás natural no Brasil vem passando por transformações se preparando para a redução do papel da Petrobras. Parte dos desdobramentos dessas medidas estão surtindo efeito agora, com o início dos primeiros contratos de suprimento de gás com outros provedores que não a Petrobras. Quais são esses resultados?

[Flávia] Camila, os primeiros resultados são animadores. Um dos grandes marcos da abertura do setor de gás no Brasil estava agendado para o dia 1 de janeiro de 2022, quando a Petrobras não poderia mais comprar gás na boca do poço de outras petroleiras. Por isso, desde o ano passado essas empresas começaram a tentar acessar diretamente os compradores – principalmente as distribuidoras de gás encanado – para venderem seu gás.

Petroleiras como Shell, Equinor, Galp, 3R Petroleum, Origem energia, e Petrorecôncavo são exemplos de empresas que firmaram contratos de suprimento de gás e que agora estão fornecendo gás às distriuidoras e aos primeiros participantes do mercado livre de gás, que decidiram deixar de comprar gás de sua distribuidora local e passaram a comprar diretamente de produtores de gás.

[Camila] A Argus Media é uma empresa especializada no acompanhamento dos preços de commodities em todo o mundo. Então, conta pra gente: já é possivel ver o reflexo dessa mudança nos preços do gás?

[Flávia] Camila, entre os produtos que a Argus oferece a seus leitores está a publicação Argus Brazil Gas and Power, que desde Novembro de 2021 oferece preços diariamente para o mercado de gás natural e energia elétrica no Brasil. Entre esses preços, calculamos diariamente os preços médios de fornecimento no mercado atacadista de gás natural no Brasil.

E sim: a inclusão de novos contratos de suprimento no mercado brasileiro, por empresas que não a Petrobras, resultou em uma redução imediata de 11 porcento no preço médio do gás natural no atacado, antes da parcela das distribuidoras. Isso foi efeito direto da competição com mais fornecedores.

Se considerarmos as médias de preços de todo o ano de 2021 (quando sabemos que os preços do gás natural subiram muito no mercado mundial e aqui no Brasil também, devido à seca que restringiu a geração hidrelétrica), e compararmos com a média de preços praticada no começo de 2022, sob influencia dos contratos novos, vemos que na malha de transporte do Nordeste do país o preço do gás no atacado subiu 9 porcento enquanto em outras malhas que ainda não tinham novos contratos o preço subiu até 33 porcento! Mais uma vez, resultado da competição e entrada de novos agentes!

[Camila] Você pode explicar melhor pra gente o que influenciou essa redução de preços, Flávia?

[Flávia] Camila, temos de voltar ao começo da conversa, quando comentei contigo que uma das determinações que o órgão antitruste Brasileiro, o CADE, havia pactuado com a Petrobras, era de que ela não pudesse mais comprar volumes de outras petroleiras a partir deste ano.

Pelo modelo anterior do mercado do gás, como a Petrobras era a dona de toda a malha de transporte e de processamento de gás, as petroleiras que estavam no país produzindo óleo e gás não tinham como escoar sua produção de gás. O petróleo era envasado e vendido ao redor do mundo, mas o gás tinha de ser vendido por aqui mesmo... Isso fazia com que as petroleiras instaladas no Brasil tivessem de vender para a Petrobras, a preço de custo, cerca de 14 mn de m³/d. Elas não perdiam dinheiro, mas ganhavam muito pouco para passar a titularidade daquele gas à estatal, que depois vendia esse produto no mercado.

Com a nova lei do gás, que determinou que a Petrobras vendesse seus gasodutos e cedesse acesso a qualquer petroleira nas unidades de processamento de gás (as refinarias de gás), esses volumes de gás que chegavam ao consumidor como Petrobras passaram a chegar pelas mãos de outros forncedores a partir deste ano.

[Camila] ... e como elas vendiam a preço de custo para a Petrobras, puderam fazer preços menores nos contratos assinados neste começo do novo mercado, competindo com a Petrobras, e ainda assim serem melhor remuneradas.

[Flávia] Exatamente, Camila. Mesmo adicionando os custos extras, como o escoamento, o processamento, e o transporte, ainda assim essas empresas conseguiram ser remuneradas com preços menores que os praticados pela Petrobras.

Além disso, no final do ano passado, a Petrobras informou que teria de aumentar seus preços de gás no mercado atacado, pois teria de importar GNL para conseguir atender sua demanda, em parte devido ao crescimento dessa demanda, mas também porque ela não estaria mais comprando esses 14mn de m³/d de outros fornecedores. Com isso, em novembro a Petrobras avisou que teria uma nova fórmula de preço, que também elevou o valor final do suprimento Petrobras, alargando a diferença entre o gás dos novos supridores e o da estatal.

[Camila] E quais são as perspectivas para os próximos passos do mercado aberto de gás, Flávia?

[Flávia] Camila, ainda temos um caminho a trilhar, em especial nas regulações, nas legislações estaduais, em facilitar o acesso a investidores de infraestrutura, em baratear custos de processamento e transporte, em definir regras de comercialização, apenas para citar alguns. Mas já vemos muita coisa interessante acontecendo, e até mesmo a criação de primeiras operações em um pequenino mercado secundário, com a venda de volumes de gás entre consumidores, por exemplo. Também vemos cada vez mais a penetração do GNL e novas estruturas de liquefaçao e terminais de processamento sendo instalados, o que vai dar ainda mais flexibilidade para os consumidores de gás.

Outro ponto importante é que com competição, o mercado passa a se interessar mais e se preocupar com formas de indexação de preços em seus contratos de suprimento, de forma a permitir melhor alocação de riscos, hedging...

Antes do novo modelo do mercado de gás, a Petrobras firmava todos os contratos baseados no preço do Brent, o petróleo cru produzido na Europa. Como ela produz petróleo, fazia sentido para ela. Nos novos contratos das distribuidoras firmados com outras petroleiras, os contratos tem uma gama maior de tipos de precificação: tem contrato com o Henry hub – o principal preço do gás natural nos Estados Unidos – outros com indicador de gas natural liquefeito no mercado internacional, outros com inflação americana, alguns com uma miscelânia disso tudo.

Com competição, vemos o surgimento de um mercado alinhado às diferentes necessidades dos agentes, o que é bonito de se ver.

E é para isso que a Argus está aqui, diariamente alocando sua expertise para ajudar os agentes do setor de gás natural e energia a navegarem por esse novo mercado, com a ajuda de nossos preços, dados e análises. Conte com a gente.

[Camila] Muito obrigada, Flavia. Vamos seguir acompanhando tudo isso de perto e ajudando a iluminar esse novo mercado.

Esse e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado.

Visite a página para seguir acompanhando os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities e entender seus desobramentos no Brasil e na América Latina. Voltaremos em breve com mais uma edição do “Falando de Mercado”. Até logo!

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