Camila Fontana: Olá, pessoal. Estamos de volta com Falando de Mercado, a série de podcasts semanais da Argus sobre os setores de commodities e energia. Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta da redação da Argus no Brasil e convido vocês a acompanhar essa discussão sobre fertilizantes sustentáveis com Bruno Castro, especialista da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes.
Bruno, o Brasil hoje importa 80pc do fertilizante que precisa para suprir o agronegócio e o Plano Nacional de Fertilizantes foi lançado pelo governo em 2022, justamente para aumentar a produção interna, inclusive com fertilizantes sustentáveis. Então, antes de entrarmos no tema da sustentabilidade, acho que vale a pena você dar um panorama do PNF e da produção doméstica.
Bruno Castro: Olá, Camila. Olá a todos os nossos ouvintes. É isso mesmo. Para falar sobre a produção de fertilizantes sustentáveis no Brasil, é preciso entendermos como está a produção hoje. Apesar do Brasil ser o quarto maior consumidor de fertilizantes do mundo, com cerca de 8pc do consumo global, cerca de 85pc dos produtos utilizados nas lavouras brasileiras são importados. É importante destacarmos que existem no Brasil grandes reservas de matéria-prima para produção de fertilizantes fosfatados e potássicos, especialmente no Amazonas e em Minas Gerais.
Para mudar esse cenário, o Brasil aprovou em 2022 um plano para aumentar a produção doméstica, de forma que ela atenda entre 40pc e 50pc da demanda interna em até 2050, o chamado Plano Nacional de Fertilizantes (PNF). As principais ações de curto e médio prazo do PNF visam reativar, concluir ou até expandir as unidades de produção. No médio prazo, a produção local deve aumentar em quase 10 milhões de toneladas por ano até 2029, de acordo com estimativas feitas pela Argus.
Esse total é principalmente para produtos à base de nitrogênio nas plantas da Petrobras, já que o gás natural explorado pelo estatal é fundamental para a produção fertilizante. Essa estratégia de expandir a produção doméstica também reduziria a exposição do Brasil às flutuações cambiais e conflitos geopolíticos. A exemplo da alta significativa nos preços de adubo em 2022, quando começou o conflito entre Rússia e Ucrânia, já que os russos são grandes fornecedores de adubo para o Brasil.
O mesmo foi observado recentemente com a escalada das tensões no Oriente Médio. Tanto o Irã quanto Israel são fornecedores de nutrientes para o mercado brasileiro, com os iranianos fornecendo cerca de 13pc das importações de ureia do Brasil nesse ano. Além disso, aumentar a produção de fertilizantes verdes reforçaria a liderança que o Brasil quer ter no debate de combate às mudanças climáticas.
CF: E Bruno, o que são os fertilizantes sustentáveis ou fertilizantes verdes, como você citou agora?
BC: Bom, o PNF, além de visar aumentar a produção nacional dos fertilizantes tradicionais, que são os químicos e os minerais, ele propõe elevar a oferta de produtos orgânicos e organominerais, assim como o reaproveitamento de resíduos sólidos.
Quando falamos do mercado brasileiro, as principais categorias de produtos sustentáveis hoje são: os fertilizantes orgânicos, que são gerados a partir de fontes animais ou vegetais; os organominerais, que são resultado da mistura de um ou mais desses fertilizantes; os hidrossolúveis, que são aqueles que se dissolvem facilmente na água e são aplicados por meio de irrigação ou aplicação foliar; os bioestimulantes, que aumentam o crescimento e a resistência das lavouras à seca; e por fim os fertilizantes de baixo ou zero carbono, que são produzidos a partir de fonte de energia renovável.
Atualmente, as cadeias de fertilizantes sustentáveis no Brasil representam apenas uma pequena parcela do consumo, mas o PNF indica que há potencial de crescimento.
CF: Qual é o potencial de crescimento desse segmento no Brasil? Quais são os dados mais relevantes para termos uma ideia disso?
BC: Bom, para situar a produção no Brasil, é importante falarmos sobre o aumento nos custos de produção, especialmente para os fertilizantes tradicionais.
Esse aumento deve incentivar os agricultores a buscar um maior valor agregado na produtividade por meio de prêmio de sustentabilidade. Essa foi a avaliação de especialistas do setor e representantes do Ministério da Agricultura em um evento promovido pela Argus em São Paulo. Das 872 empresas que produzem ou importam fertilizantes para o Brasil, aproximadamente 54pc operam com produtos orgânicos e 44pc com organominerais, segundo um estudo da Associação Brasileira das Indústrias de Nutrição Vegetal (Abisolo).
Nesse total, apenas 1,2pc operam com bioestimulantes. O PNF estima que esses investimentos em fertilizantes orgânicos e organominerais poderiam multiplicar a produção doméstica por seis até 2050, mas o plano não especifica os volumes de produção atual.
Para aumentar a competitividade dos produtos brasileiros, o plano recomenda ainda uma reforma para equalizar os impostos sobre produtos nacionais e importados, além da padronização de normas estaduais e municipais.
CF: E, Bruno, precisamos de energia para produzir fertilizantes e, se é para ser sustentável, a energia precisa ser limpa. Como o PNF aborda essa questão?
BC: Bom, como você falou, a produção de fertilizantes consome energia e para tornar o produto final sustentável, a matriz energética nessas unidades precisa ser renovável.
Nesse sentido, o PNF sugere acordos bilaterais com os países vizinhos do Brasil na América Latina, como Bolívia, Chile e Uruguai. Isso visa diversificar a oferta externa e integrar o mercado regional de gás natural, que é uma matéria-prima essencial para produção de fertilizantes a base de nitrogênio.
Outra estratégia para aumentar a oferta de gás no Brasil é a produção de biometano no âmbito do RenovaBio, uma política aprovada em 2024 que busca promover o uso de de biocombustíveis. O biometano, que é produzido por meio da decomposição de resíduos orgânicos, é uma das matrizes energéticas com potencial para abastecer as estratégias do PNF.
O produto final dessa decomposição é um combustível gasoso que pode ser usado para gerar eletricidade e ser injetado em gasodutos para distribuição e alimentação dessas fábricas de fertilizantes.
CF: Muito obrigada, Bruno. A Argus seguirá monitorando a evolução do mercado de fertilizantes sustentáveis. Você volta em breve ao falando de mercado para compartilhar atualizações com os nossos ouvintes.
Obrigada a você que acompanhou o nosso podcast hoje. Todos os episódios estão disponíveis no site argusmedia.com e nas principais plataformas de streaming. Voltamos na semana que vem com mais uma edição. Até lá.