

Falando de Mercado: Argus Base Oils LatAm Conference debate tendências para óleos básicos e lubrificantes
- 16 de junho de 2025
- Market: Oil Products, Base Oils & Waxes
O mercado de óleos básicos e lubrificantes da América Latina se adapta à indecisão da política comercial dos Estados Unidos enquanto as importações avançam na região. Julio Viana, especialista em óleos básicos da Argus para a América Latina e integrante da equipe responsável pelo relatório Argus Base Oils, compartilha os destaques da Argus Base Oils Latin America Conference em Miami, incluindo óleos básicos renováveis, biolubrificantes e veículos elétricos. Acompanhe a conversa de Julio com Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil.
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Transcript
Camila Fontana: Olá, pessoal! Voltamos com mais uma edição do Falando de Mercado, a série de podcasts semanais da Argus sobre os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo.
Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil, e hoje eu converso novamente com o Julio Viana. Ele é especialista em óleos básicos da Argus para a América Latina, integrante da equipe responsável pelo relatório Argus Base Oils, que foca nas matérias-primas e na cadeia de produção de lubrificantes para veículos e maquinário.
Julio retornou recentemente de Miami, onde ele foi um dos palestrantes da Argus Base Oils Latin America Conference, e vai trazer o que foi falado no evento e o panorama geral deste mercado em várias partes do mundo, inclusive aqui no Brasil.
Julio, obrigada pela sua presença mais uma vez. Claro, a conferência em Miami teve uma agenda muito extensa. Não dá para falar de tudo, mas o que você selecionaria como mais relevante para os nossos ouvintes?
Julio Viana: Obrigado, Camila. Essa foi a nossa primeira conferência, é a primeira realização da Argus que a gente está fazendo focada no público da América Latina para base oils. Ocorreu lá em Miami, entre os dias 20 e 21 de maio, e foi muito importante pra gente realizar esse evento porque já era uma demanda dos nossos clientes e dos nossos assinantes da região ter um espaço onde eles poderiam discutir o futuro dos movimentos de mercado de óleos básicos para a América Latina.
É um mercado que vem em grande crescimento nos últimos anos. Ele está intimamente ligado ao funcionamento do mercado dos Estados Unidos, principalmente, e uma parte da Ásia. Ele atraiu uma grande variedade de participantes, não só da América Latina, mas também desses outros continentes.
Entre as várias conversas que tivemos, a gente conversou não só de como está o mercado hoje, mas também do futuro dos lubrificantes para veículos elétricos, de alguns óleos básicos um pouco mais pesados, e qual é o peso deles hoje na indústria. Também falamos um pouquinho de óleos básicos renováveis e biolubrificantes. Mas, para além de tudo isso, eu separei aqui os movimentos de mercado mais gerais no mercado de óleos básicos, tanto a nível global como a nível um pouco mais regional da América Latina, e contar um pouco da situação dos Estados Unidos, já que as políticas de lá impactam tanto no funcionamento do mercado latino, como a gente bem sabe.
CF: A gente vai falar da política comercial nos Estados Unidos, mas acho que antes vale a pena dar um panorama de América Latina como um todo. A gente tem visto um aumento de importações. Quais seriam os fundamentos desse crescimento nas compras de produtos importados?
JV: É sempre importante destacar que a América Latina é dependente inteiramente do consumo de óleos básicos grupo dois e grupo três de importações. Já existe uma demanda que é, no momento, fixa da região e que não tem perspectiva de muita mudança, pelo menos até 2028. Não tem nenhuma promessa de nenhuma fábrica de grupo dois ou três aqui na região.
Em 2028, a Petrobras vai fazer o lançamento de uma planta de óleos básicos grupo dois, mas, até lá, essa é uma região que é altamente dependente de importações. A gente tem observado que houve um crescimento de 25pc nas importações para essa região, para a América Latina, nos últimos cinco anos. Isso se deve a muitos fatores.
Alguns deles são a modernização da frota de veículos da América Latina, que continua muito antiga, mas tem se modernizado. Também tem cada vez mais a entrada de veículos elétricos, o que acaba forçando a procura por outros tipos de lubrificantes na região também. Mas é muito porque países produtores começaram a enxergar a América Latina como um lugar para direcionar toda a produção que eles estavam fazendo, e a América Latina foi entendendo e foi criando cada vez mais mecanismos para importar cada vez mais.
Isso aconteceu, principalmente, no Brasil. O Brasil, no total de importações para a região, cobre cerca de 40pc, 50pc das importações de óleos básicos. Então, o Brasil se tornou o principal hub, o principal ponto de destino dessas importações, e foi um dos que mais cresceu a demanda e, consequentemente, cresceu o número de importadores aqui.
CF: Julio, durante a conferência, com certeza falou-se da política comercial dos Estados Unidos, das idas e vindas, do impacto que isso tem ou pode ter sobre os fluxos de óleos básicos para a América Latina. O que foi falado na conferência?
JV: Basicamente, quando falamos dos Estados Unidos, a gente tem uma palavra na cabeça que é incerteza. A incerteza permanece como um dos fatores que estão afetando o mercado norte americano e, consequentemente, eles afetam um pouco da política de exportações que estão enviando para a gente. A primeira coisa que a gente precisa ter em mente é que as tarifas que o Trump tinha colocado antes não incluem produtos energéticos, que é onde o óleo básico se encaixa. Derivados de petróleo não se encaixam nas tarifas que o Trump impôs nessas últimas medidas, porém, o que acaba influenciando muito é a imposição de tarifas para metais, peças de carro.
O impacto dessas tarifas a gente já pôde ver no primeiro trimestre de 2025, que contraiu 0,3pc. Essa foi a primeira contração desde o primeiro trimestre de 2022. Com isso, obviamente, teve queda nas ações dos Estados Unidos, um aumento nos rendimentos dos títulos do Tesouro norte-americano, e isso cria um cenário de instabilidade para a economia.
A gente percebe que o consumidor de lubrificantes, por exemplo, vê que é muito mais válido manter o dinheiro dele guardado, rendendo o máximo possível, do que realmente correr para fazer estoque de lubrificante. Há uma diminuição da demanda de lubrificantes e, consequentemente, uma oferta de óleos básicos ali nos Estados Unidos que pode ou não ser direcionada para a região da América Latina num primeiro momento.
Importante também dizer que Europa e México, dois grandes importadores de óleos básicos dos Estados Unidos, não aplicaram tarifas sobre esses produtos dentro dos países deles. Eles continuam recebendo grande parte desse produto que vai ser direcionado para esses outros mercados. E a China - tivemos algumas perguntas nesse sentido – não é um grande parceiro comercial de óleos básicos dos Estados Unidos, então também existe pouco efeito.
Por enquanto, ainda tem o México como um dos grandes parceiros que recebem quase toda a demanda deles de óleos básicos. Essa relação permanece inalterada porque não houve imposição de tarifas, a mesma coisa com a Europa, com o Brasil e outros países da América Latina. O que a gente observa é uma pressão indireta. A economia sofre com essas tarifas e há uma queda na demanda de lubrificantes dentro dos Estados Unidos.
Uma coisa também importante que foi falada na conferência é como a produção de óleos básicos deve permanecer em alta a nível mundial, mas principalmente a nível dos Estados Unidos. A gente sabe que existe uma relação muito profunda e direta entre a produção de diesel e óleos básicos. Como vocês devem saber, óleos básicos são um dos derivados do petróleo, mas eles não são o foco na produção de derivados. O foco é sempre nos combustíveis, principalmente diesel e gasolina.
Ao falar da produção de óleos básicos, temos que pensar que o mercado norte-americano vai tentar proteger o mercado de diesel. Ele vai manter a produção dele sob controle para os preços não caírem absurdamente porque, se ele produzir demais, os preços podem cair. E, em decorrência disso, eles acabam mantendo a produção de óleos básicos alta. Isso deve permanecer. A gente discutiu que não tem uma perspectiva de diminuição da produção de óleos básicos. Existe uma demanda baixa dentro dos Estados Unidos por conta da contração econômica. A gente tem uma alta produção de óleos básicos, que é independente de qualquer outra coisa.
O que a gente observa é que, muito provavelmente, vai haver uma oferta bem grande de óleos básicos para a região da América Latina. Se isso vai afetar os preços ou não, vai depender também da demanda de óleos básicos em outras regiões que se servem desse produto pelos Estados Unidos. Como eu falei, a Europa é uma delas.
CF: Você deu um panorama geral do mercado de óleos básicos, os aspectos de oferta e demanda, mas a gente pode, um pouquinho segmentando, falar dos óleos do grupo três, que são os óleos sintéticos. A gente tem visto um movimento de aumento do consumo desse produto. Ele está vindo de onde, majoritariamente?
JV: Majoritariamente, ele vem hoje da Ásia. Isso também foi algo que a gente conversou nessa conferência. A grande produção de grupo três, que aumentou a produção de grupo três nos Estados Unidos, é usada internamente no país. Eles não fazem exportação de grupo três, não é o grande foco deles. A grande maioria do grupo três que chega hoje na América Latina vem da Ásia.
E a gente discutiu como a América Latina vem aumentando a demanda por grupo três. Isso tem algumas causas. A primeira e mais óbvia delas é, com certeza, a queda nos preços de grupo três. A gente observou, nesse último ano, uma forte diminuição nos valores, muito por conta do fato de que Estados Unidos começou a fazer produção de grupo três internamente, então houve um aumento de oferta. Eles não precisaram fazer mais tantas importações da Ásia, e isso fez uma pressão nos preços, eles baixaram. Vimos, nesse último ano, esses produtos ficando um pouco mais baratos, ao mesmo tempo que, como eu disse, a América Latina vem modernizando o seu parque de veículos.
Claro, ainda é um parque de veículos muito antigo. Para vocês terem uma ideia, a gente fez um apanhado com a idade média da frota de veículos da América Latina, e na Argentina e no Peru, por exemplo, a média de idade da frota de veículos é de 14 anos. É uma frota bem velha, enquanto o Chile é um dos países da América Latina que tem uma frota mais nova. A média deles é de nove anos. Coincidentemente, o Chile é um dos países que menos consome grupo um na América Latina. Hoje ele consome muito mais grupo dois e grupo três.
Também teve um aumento das vendas de carros híbridos nessa região. Houve um aumento de 90pc nas vendas de carros híbridos em 2024 aqui no Brasil. Na Argentina, foi um crescimento de 48pc. No Chile, as vendas mais que dobraram. E uma coisa interessante do Chile também é que o governo colocou como meta que, até 2035, deve ter produção de apenas veículos elétricos dentro do país.
Temos visto uma mudança realmente na frota e, consequentemente, uma maior demanda por lubrificantes sintéticos que são produzidos a partir do grupo três, e uma entrada cada vez maior desse produto na região.
A gente também sabe que a Índia, assim como outros países da Ásia, faz uma oferta de grupo três diferenciada, também um pouco mais barata, muito porque eles fazem geralmente um blend de grupo três de diversas marcas que eles podem cobrar um pouco mais baixo. E isso também acaba gerando maior entrada no mercado latino-americano porque o pessoal vê mais chances de experimentar com esse produto.
CF: Você citou a Argentina. A Argus tem uma cobertura bastante robusta do mercado de óleos básicos por lá. Qual é o cenário na Argentina, Julio?
JV: Na Argentina, o que temos observado é que essa instabilidade econômica que eles vêm passando acabou diminuindo o consumo de combustível. Isso quer dizer menos carros e, consequentemente, menos uso de lubrificantes. Vimos uma queda na demanda, ao mesmo tempo que a produção de óleos básicos deles cresceu. Isso aponta para um papel exportador da Argentina no momento. Hoje, ela faz a exportação de óleos básicos de grupo um - como eu disse, porque só há produção de grupo um na América Latina -, mas principalmente um grupo pesado para Brasil, outras regiões da América Latina e outros continentes.
CF: Vamos encerrar, então, falando de Brasil. O que você tem visto que tem chamado a sua atenção, Julio?
JV: Conversamos muito nessa conferência sobre o aumento da competição dentro do mercado de lubrificantes tanto na América Latina quanto, principalmente, no Brasil. Quando falamos de demanda por lubrificantes no Brasil, a gente observa que teve um crescimento de 39pc nos últimos nove anos, e 25pc foi o crescimento da demanda entre 2019-24, muito em paralelo com a recuperação das vendas de veículos que tem retomado lentamente os níveis pré-pandêmicos no Brasil.
Com esse aumento de demanda, também vimos um aumento de players. Hoje, há 220 companhias fazendo vendas de lubrificantes e consumindo óleos básicos no Brasil. Isso é 70pc a mais do que dez anos atrás. O número de importadores cresceu, o número de competidores no mercado cresceu.
O que observamos é que a importação foi aumentando junto, e o número de pessoas que fazem revenda de produto importado no Brasil também cresceu. Como eu tinha dito antes, a região em si é amplamente dependente de importação para produtos do grupo dois e grupo três. Isso já era esperado de acontecer, mas, com a aceleração da demanda, muita gente entrou nesse mercado e o que a gente vem observando no país é um aperto das margens porque quanto mais participantes têm no mercado, mais há uma briga de preços e as margens precisam acabar se estreitando um pouco para conquistar market share.
Esse é o cenário principal que a gente vem observando no mercado brasileiro de lubrificantes.
CF: Muito obrigada, Julio. Muito obrigada a você que nos acompanhou até aqui. Este e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus. A gente volta em breve com mais uma edição do Falando de Mercado. Até a próxima!