• 27 de outubro de 2025
  • Mercados: Crude

Com a expansão do pré-sal e avanços na infraestrutura offshore, o Brasil se aproxima da marca de 4 milhões de barris de petróleo produzidos por dia. Acompanhando esse crescimento, a Argus lançou preços FOB para os óleos de Tupi, Mero e Búzios, facilitando a comparação com matéria-prima de outras localidades e o entendimento dos custos para as refinarias. Saiba mais nesta conversa entre Camila Fontana, chefe adjunta de redação no Brasil, e João Scheller, especialista do relatório Argus Crude. 

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Camila Fontana: O que está por trás do aumento da produção de petróleo no Brasil? A expectativa é de crescimento ainda maior impulsionado pelos campos do pré-sal e por grandes investimentos.

Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta da redação da Argus em São Paulo, e hoje eu converso com o João Scheller, especialista na indústria petrolífera da América do Sul e colaborador do relatório Argus Crude. João, quais são os aspectos mais notáveis desse aumento na produção de petróleo no Brasil?

João Scheller: Camila, primeiramente, obrigado por me receber aqui mais uma vez. 

É sempre legal compartilhar um pouco do mercado de petróleo com vocês. O Brasil produziu 3,9 milhões de barris por dia de petróleo em agosto de 2025, os dados mais recentes da ANP. Isso foi um aumento de 16,5pc em relação à ano anterior. 

Então, é um crescimento expressivo, chegando próximo dos 4 milhões de barris por dia, que é uma meta que há alguns anos já o mercado petroleiro tem em mente. O país tem produção em diferentes regiões, mas os campos do pré-sal, os famosos campos do pré-sal que ficam na costa brasileira offshore, são os principais responsáveis por esse crescimento, respondendo por cerca de 80pc da produção total de petróleo e gás do Brasil.

O campo de Búzios, inclusive, que fica na Bacia de Santos, é o maior produtor, passou o campo de Tupi recentemente, e tem mais ou menos uma produção de 821 mil barris por dia. 

A gente tem um crescimento grande de produção brasileira, puxado por esse aumento de produção dos campos do pré-sal, e também em melhorias de infraestrutura. Dá para citar, por exemplo, a plataforma Almirante Tamandaré, da Petrobras, que atingiu 225 mil barris por dia de produção, que é sua capacidade máxima, antes mesmo da data prevista. Isso aconteceu recentemente. 

A gente tem uma série de desenvolvimentos na indústria petrolífera brasileira, que estão levando o Brasil a chegar a uma produção de cerca de 4 milhões de barris por dia.

CF: Para onde vai o petróleo brasileiro? E não só isso, uma pergunta relacionada. O mercado é um pouco diferente do resto da América Latina. Por que isso?

JS: Sim. Bom, começando pela sua primeira pergunta, os principais mercados que recebem o petróleo brasileiro são a China e a Europa. A gente tem também exportações para os Estados Unidos, para a Índia, para outros destinos. E, claro, além do refino que é feito domesticamente nas refinarias brasileiras. Mas os principais mercados são China e Europa.

Bom, no que diz respeito à característica do mercado, o petróleo brasileiro é majoritariamente vendido na modalidade Delivered, que seria basicamente o petróleo entregue. O preço entregue já inclui os custos com frete, já inclui os custos com seguro, outros encargos, depende da modalidade.

Ele é diferente da opção Free On Board (FOB), que é uma opção de carregamento em que o comprador vai até o local, carrega o seu navio e fica responsável por todo o resto da logística para levar essa carga até o seu destino. Outros mercados latino-americanos, a gente pode citar a Argentina, Colômbia, Guiana, eles vendem seus carregamentos na modalidade FOB majoritariamente. 

A gente sempre tem contratos específicos entre empresas que podem ter algum tipo de variação, mas o mercado brasileiro é conhecido por seu mercado de vendas entregue. E a gente tem várias razões por trás disso. Primeiro que o mercado brasileiro não era aberto a empresas independentes até algumas décadas atrás. Com a produção controlada pela Petrobras, controlada pelo Estado brasileiro, o principal responsável pela exportação era a Petrobras, e era uma empresa muito grande que tinha capacidade de comercializar o petróleo e gerenciar essa logística toda por ponta própria.

Mas outro fator importante que é interessante mencionar, tem algumas especificidades interessantes, é o uso dos navios com posicionamento dinâmico. Em inglês chama-se Dynamic Positioning Vessel, ou seja, são conhecidos como navios DP na sigla do setor. 

CF: E o que são esses navios DP especificamente?

JS: Então, as águas brasileiras, na costa brasileira, offshore, elas têm correntes tão fortes que os produtores precisam usar esses navios DP para descarregar o petróleo das plataformas para evitar colisões. O que acontece? Esses navios, eles são chamados de navios de posicionamento dinâmico porque eles são equipados para ajustar a posição na água e permanecer estáveis mesmo com essas correntes bem fortes. 

O carregamento sai da plataforma, pode ser uma plataforma flutuante como a FPSO, ou pode ser uma plataforma fixa, mas ele sai para o navio DP, depois o navio DP leva esse petróleo até uma área de transferência para outro navio, ou até um porto, onde ocorre a transferência do navio DP para um navio de exportação, digamos assim, um navio convencional que vai levar a carga para o seu destino. 

Dá para imaginar que isso adiciona um grau de complexidade bem grande e consequentemente um custo maior a essa operação. Então essa é mais uma razão pela qual os produtores já incluem o frete no preço e vendem o petróleo na modalidade entregue, porque toda essa complexidade da cadeia eles já têm que estar preparados para conseguir fazer a produção rodar com esse ponto a mais no descarregamento da carga.

CF: João, como as avaliações da Argus ajudam os participantes de mercado a entenderem o mercado brasileiro?

JS: Bom, a Argus já tem avaliações de preço, ela tem Price Assessments, como a gente chama, para Búzios entregue na Europa e para Tupi entregue na China. São referências bastante importantes para a gente entender o valor do petróleo brasileiro nos dois principais destinos, nas modalidades em que ele é majoritariamente comercializado. 

Mas claro, ainda é difícil entender qual o valor do custo FOB do petróleo brasileiro e comparar ele com outras opções na região, como a gente mencionou, outras opções na região que são muitas vezes comercializadas na modalidade FOB. É inclusive por isso que a Argus está lançando agora avaliações de preço FOB para Tupi, Búzios, esses dois tipos de petróleo que a gente já faz Price Assessments, já publica, e também para Mero. Então, a partir de agora, a Argus também vai fazer uma análise de preço FOB dos petróleos brasileiros. 

A ideia é trazer mais transparência para o mercado, a ideia da Argus sempre é essa, e também facilitar essa compreensão do valor dos petróleos brasileiros, fazer uma comparação mais fácil com petróleos de diferentes localidades e ajudar também a entender o custo para os refinadores locais.

CF: E o que se espera do Brasil em termos de produção no futuro próximo?

JS: Olha, a produção do petróleo brasileiro deve crescer bastante nos próximos anos, vai ser impulsionada especialmente pelos campos do pré-sal, mas a gente também vai ter investimentos, espera-se que tenha investimentos grandes para produção e exploração nos próximos anos.

A gente pode usar como referência uma pesquisa da empresa de pesquisa energética, a EPE, que a produção do Brasil deve chegar a um pico de 5,3 milhões de barris por dia em 2030. É relativamente próximo essa data, cinco anos, e vai ser impulsionada especialmente pela produção do pré-sal, se levar em conta especialmente o aumento de produção desses campos. 

Mas o Brasil também estuda explorar outras reservas, a gente tem a Bacia de Pelotas, por exemplo, no sul do país, em que estão sendo feitos estudos para exploração, e especialmente na margem equatorial, que fica ao norte do país, proxima a Guiana, Suriname, que são regiões que a gente já teve descobertas de grandes reservas de petróleo.

A Guiana é um grande exemplo, tem puxado um aumento de produção na América Latina como um todo, e esse início de exploração lá pode levar a produção de petróleo brasileiro para um outro nível. Claro, esse início de exploração está demorando um pouco, devido à proximidade que a região tem com a Floresta Amazônica, uma área obviamente ambientalmente sensível, mas uma vez iniciada, a gente estima que a margem equatorial pode conter até 10 bilhões de barris equivalentes de petróleo recuperável, que poderia, como mencionei, levar a produção brasileira para um outro nível em termos de produção de petróleo globalmente.

CF: Obrigada, João, muito legal ter essa visão toda sua de América do Sul. 

Obrigada aos nossos ouvintes, continuem acompanhando a série Falando de Mercado, e a gente se vê na semana que vem. Obrigada.