

Produção em Vaca Muerta e demanda por petróleo argentino
Petróleo argentino chega à China, e produtores buscam expandir exportações de Medanito, destacando o interesse asiático em Vaca Muerta.
- 5 de novembro de 2025
- Mercados: Crude
A ida de petróleo argentino para a China demonstra o interesse da Ásia na produção dos campos de Vaca Muerta. Produtores argentinos planejam expandir o fluxo de exportação de óleo do tipo Medanito para outros mercados. Saiba mais acompanhando a conversa entre Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil, e João Scheller, responsável pela cobertura do mercado de petróleo na América do Sul para o relatório Argus Crude.
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Camila Fontana: A ida de petróleo argentino para a China demonstra o interesse da Ásia na produção dos campos de Vaca Muerta. Produtores argentinos planejam expandir o fluxo de exportação de óleo do tipo Medanito para outros mercados.
Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil, e hoje eu converso com João Scheller, responsável pela cobertura do mercado de petróleo na América do Sul para o relatório Argus Crude. João, obrigada, primeiramente, por estar aqui novamente.
A Argentina recentemente enviou um carregamento de petróleo Medanito para a China. O que esse marco diz sobre a evolução do mercado?
João Scheller: Bom, Camila, eu que agradeço por participar novamente aqui do podcast. Esse carregamento é importante porque é a primeira vez que estamos vendo o petróleo Medanito indo diretamente pra China. Esse carregamento que estamos referindo é um navio com aproximadamente 900.000 barris de petróleo que foi carregado em setembro. Até então, já houve Medanito indo para a China, algumas vezes, via armazenamento no Panamá. Esse carregamento específico marca uma mudança logística, mostra um interesse asiático no Medanito. Também houve uma segunda carga, planejada para o mês de outubro, que também vai diretamente para a China, mas é um co-carregamento - um carregamento que ocorre junto com outro tipo de petróleo, sendo um carregamento de Medanito junto com um petróleo brasileiro. O petróleo Medanito vai ser carregado na Argentina, e depois vai passar para outro navio com petróleo brasileiro e, aí sim, seguir para a China.
Por que isso importa? Há uma esperança, uma expectativa dos produtores argentinos de conseguirem expandir o mercado do Medanito na Ásia. E o mercado do petróleo brasileiro na Ásia já é bem desenvolvido. O principal destino de exportação do petróleo brasileiro é a China. Eventualmente, um carregamento compartilhado pode ser um prelúdio do que poderia ser um fluxo regular de exportação da América do Sul, da Argentina e do Brasil, até a China. Claro, isso vai depender de avanços logísticos na Argentina, para exportação do petróleo Medanito que é produzido em Vaca Muerta.
CF: E quais são essas principais barreiras logísticas que requerem esses avanços?
JS: Atualmente, o principal centro de exportação do Medanito é o porto de Rosales. O porto recebeu inclusive uma licença final para conseguir operar depois das melhorias que ocorreram por lá na metade deste ano, e a partir de agora é possível carregar Suezmax em porto Rosales, que são navios maiores que os Panamax e Aframax que até então eram os principais tipos de navios utilizados para a exportação de Medanito. Mesmo assim, porto Rosales ainda tem restrições de calado que limitam o carregamento desses navios a, mais ou menos, 800.000 barris.
Ainda há limitação logística, mesmo com esses avanços recentes por lá. E o porto segue sem ser compatível com VLCCs, que são os navios grandes para exportação de petróleo, os preferidos para envios de longa distância para a Ásia, para a China. Esse co-carregamento com petróleo brasileiro poderia ser uma alternativa, algo a ser explorado para reduzir custos de frete e melhorar a eficiência desse carregamento, mas ainda é difícil ser economicamente viável. Esse carregamento que mencionamos parece mais uma operação de teste, uma operação feita pela primeira vez, do que necessariamente o início de uma rota regular de exportações para a China.
Estamos falando bastante de China, mas atualmente o mercado de exportação do Medanito não é a China. O principal mercado de exportação do Medanito é a Costa Oeste dos EUA. Na primeira metade deste ano, 70% das exportações de Medanito via mar foram para a Costa Oeste dos EUA. Basicamente, o mercado de Medanito conseguiu ter alguns avanços com esse envio de navios para os EUA.
A Argus, inclusive, atualizou seus assessments de frete para incluir os Suezmax até a Costa Oeste dos EUA, também atualizou a metodologia do Crude Medanito para levar em conta as mudanças que ocorreram em termos de preço nesse mercado. Mas o principal desafio é, de fato, conseguir fazer com que o Medanito deixe de ser um petróleo regional, e se torne um petróleo global, chegando a outras regiões do mundo.
CF: Como a Argentina planeja superar essas limitações de infraestrutura que permitiriam que o petróleo argentino chegasse mais longe, de maneira consistente, lá?
JS: O principal deles é o oleoduto Vaca Morta Sul (VMOS). A ideia é que seja um oleoduto que conecte os campos em Vaca Muerta, de Neuquén a Punta Colorada, que é um porto bem mais abaixo de porto Rosales. É um porto que teria capacidade de carregar VLCCs. A ideia é que esse oleoduto VMOS fique pronto, comece a carregar com uma capacidade reduzida, cerca de 200.000 barris, em 2026, e que chegue até 700.000 barris por dia em 2030, que seria a capacidade final, capacidade máxima desse produto. O projeto já está 30% concluído e é um consórcio de várias empresas que incluem a YPF, que é a empresa petroleira controlada pelo Estado argentino. Outras empresas também fazem parte desse consórcio, como a Pluspetrol, Chevron, Shell e Tecpetrol. Então é um projeto que, de fato, conseguiria fazer com que o Medanito chegasse mais longe.
CF: Qual é o status atual de produção e de investimentos em Vaca Muerta?
JS: A produção em Vaca Muerta está crescendo. A Argentina atingiu um recorde de produção de cerca de 800.000 barris por dia em julho deste ano, e Vaca Muerta tem contribuído com mais de 60% dessa produção de petróleo. Então, de fato, a produção está crescendo.
Claro, a expectativa do mercado argentino é que se chegue a muito mais assim. A ideia é que a produção chegue até 1,5 milhão de barris por dia até 2030, sendo 1 milhão desses só para exportação. Seria um nível muito acima do que a gente está vendo agora. Os investimentos por lá continuam fortes. Houve anúncios recentes da YPF vendendo alguns ativos em campos maduros para migrar para um foco completo na exploração de petróleo em Vaca Muerta.
Agora é questão de tempo, em tese, para que o mercado argentino consiga avançar o suficiente para exportar Medanito para outros destinos.
CF: Quais são os riscos — identificáveis, claro — que poderiam desacelerar a expansão do petróleo argentino?
JS: Acho que talvez o principal ponto, o ouvinte até deve ter imaginado, é que esses avanços de logística, que esse processo de construção do novo oleoduto, das atualizações no porto fique pronto a tempo, a ponto de fazer com que a produção do do Medanito consiga expandir para outros mercados. Atualmente, o custo ainda de se investir em Vaca Muerta é muito alto. O avanço no mercado e no ecossistema como um todo na Argentina seria muito importante para fazer com que esses planos se concretizem.
Especificamente com relação ao VMOS, tem um ceticismo em relação ao deadline: a gente falou 2026, 2027, mas tem gente no mercado que imagina que isso fique pronto só em 2027, 2028. Não é um consenso de que ele fique pronto a tempo. Além disso, tem a instabilidade política, que na Argentina sempre é um ponto a se mencionar, para que os investidores consigam manter o ritmo de investimento na região. A economia Argentina segue sendo um desafio. Para quem acompanha o noticiário, sabe que está longe de ter sido resolvida a situação na Argentina. E o país está trabalhando para tentar tornar o cenário de investimento mais atrativo. Isso, obviamente, se refletiria também num avanço para o mercado petroleiro. E um outro risco importante, um pouco mais macro, é a perspetiva global para a demanda de petróleo nos próximos anos. A gente já tem a Opep reduzindo gradualmente os seus cortes de produção, aumentando a quantidade de petróleo disponível no mundo, e esse incremento de produção causam preocupações, levam preocupações com relação a um possível excesso de oferta no mercado. Isso pode obviamente criar um cenário de incerteza no longo prazo para a demanda de petróleo como um todo, e o Medanito está inserido dentro desse cenário e poderia impactar potencialmente o desenvolvimento do mercado petroleiro argentino.
E a gente vai discutir esse ponto de Vaca Muerta, o desenvolvimento de Vaca Muerta e outros pontos também, outros temas importantes para o mercado de óleo e gás na Argentina no Fórum de Energia da Argentina, que vai ser realizado pela Argus em Buenos Aires, no próximo dia 17 de novembro. A gente vai ter painéis debatendo o futuro do petróleo, combustíveis, e também de biocombustíveis e gás natural.
CF: Que seja um sucesso o evento. Obrigada, você, que nos acompanhou até agora. Obrigada ao João Scheller. A gente volta na semana que vem com mais Falando de Mercado. Até mais.
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