Maria Lígia Barros: Olá pessoal, sejam bem-vindos ao Falando de Mercado, uma série de podcasts semanais da Argus Media sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo.
Eu sou Maria Ligia Barros e sou especialista em etanol na publicação Argus Brasil Combustíveis. Hoje vamos falar sobre o aumento na mescla de etanol na gasolina, que foi de 27pc para 30pc, conhecido como E30. Vamos abordar o impacto dessas mudanças no mercado de etanol.
Quem está comigo para falar sobre o tema é a também especialista do Argus Brasil Combustíveis, Maria Carolina Albuquerque.
Maria Albuquerque: Olá, Lígia. É um prazer estar contigo trazendo mais um assunto relevante para o mercado sucroalcooleiro. O aumento da mescla obrigatória de etanol na gasolina foi aprovada pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), em 25 de junho e deve começar a valer em 1º de agosto.
Com o aumento da mescla, o Ministério de Minas e Energia (MME) está estimando que o consumo de etanol anidro deve aumentar em torno de 1,5 milhão de metros cúbicos (m³) por ano. E aí fica a pergunta: Como isso vai impactar a demanda e oferta do biocombustível a partir de agora?
MB: Pois é, Maria. Para entendermos melhor, vamos recapitular. O anúncio do E30 era esperado inicialmente para o começo do ano e, como já falamos aqui em uma edição anterior do podcast, a maior parte da comercialização de anidro no Brasil funciona por meio de contrato. As empresas fecham esses contratos de forma antecipada para cobrir pelo menos 90pc do volume negociado no ano anterior. Só que esses contratos para o ciclo 2025-26 foram fechados no finzinho de maio, antes do anúncio do E30.
E aí, aconteceu que muitos participantes fecharam os contratos de venda e compra de anidro considerando ainda a mescla E27. O que descobrimos é que muitos participantes incluíram uma cláusula de flexibilidade dos volumes de até 30pc para contemplar uma eventual mudança na mescla. Então, provavelmente, isso vai evitar que as empresas precisem fazer recontratações.
A demanda deve ser suprida por meio desses contratos e um eventual aumento na demanda no mercado à vista não deve acontecer nesse primeiro momento, já que os participantes devem esperar para avaliar o efeito no mercado e as saídas antes de repensar uma estratégia.
Porém, quando olhamos para o mix dos dois tipos de etanol, o anidro e o hidratado, provavelmente vai ser necessário que mais matéria-prima seja direcionada para fazer o anidro, diminuindo a disponibilidade para produção do hidratado.
MA: Isso vai ocorrer em uma safra que já está especialmente atrasada, tanto por conta da menor quantidade de cana bisada que sobrou da safra anterior e também pelas condições climáticas desfavoráveis que temos observado já nesse início de temporada, que vem desacelerando a moagem de cana-de-açúcar.
Entre abril e maio, foram registrados volumes significativos de chuva na região Centro-Sul, que é a principal região da produção sucroalcooleira do país e agora na última semana de junho também foram registradas geadas em algumas áreas da região que tem atrapalhado os trabalhos de campo nos canaviais.
Então, por conta disso, a produção de etanol na região Centro-Sul desde o início da safra em 1º de abril até 16 de junho totalizou 7,5 milhões de m³, o que é uma queda de 14,2pc em comparação com o mesmo período da safra 2024-25, de acordo com os dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA).
Além disso, os estoques disponíveis de etanol na região também estão 37pc abaixo do mesmo período no ano passado, segundo os dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), também referentes ao início da safra até 16 de junho.
Então, com essa oferta mais restrita nesse início da safra e as expectativas de um maior consumo de etanol, nós já começamos a observar o reflexo disso nos preços. Quer comentar mais sobre isso, Lígia?
MB: Então, Maria, como a expectativa de que o E30 eleve a demanda nesse momento e que os estoques estão apertados, isso deve dar suporte para os preços de etanol ao longo dos próximos meses.
Isso foi algo que vimos imediatamente no mercado à vista. Todos os nossos indicadores de preço de etanol anidro e hidratado no Centro-Sul subiram na semana do anúncio do E30.
Isso nos postos de combustíveis vai complicar um pouco a preferência do motorista pelo etanol, não é, Maria? Porque como você e os ouvintes sabem, a relação de preço entre etanol e gasolina é o que tende a definir esse consumo na bomba.
MA: Sim, Lígia. O MME está estimando que o aumento da porcentagem de etanol e hidro na gasolina pode reduzir o preço do combustível fóssil em até 20 centavos por litro.
Isso, combinado com o aumento nos preços do etanol hidratado que comentamos, tem de aumentar a paridade entre os dois combustíveis, diminuindo então a competitividade do etanol frente à gasolina. Para os consumidores preferirem o etanol na hora de abastecer, considerando custo e benefício, o preço do etanol precisa estar pelo menos 70pc o preço da gasolina.
Com o E30, que vai começar a partir de 1º de agosto, como comentamos, os participantes de mercado estão projetando que a paridade média entre os dois combustíveis deve subir e ficar entre 68 a 69pc no Centro-Sul. Isso está um pouco acima da paridade média nacional registrada na safra 2024-25 de 66pc segundo os dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Porém, os produtores acreditam que os benefícios a longo prazo do E30 para as usinas, por conta do aumento do consumo de etanol, devem compensar esse aumento da paridade no primeiro momento.
MB: É, Maria. No geral, acho que a reação do setor ao anúncio do E30 foi bastante positiva. Os participantes, além de destacarem o aumento no consumo do etanol, também ressaltaram os avanços para a descarbonização do país e redução nas importações de gasolina.
A única ressalva que foi levantada foi a respeito da necessidade de fiscalizações mais rigorosas na qualidade dos combustíveis para que se evitem fraudes e práticas irregulares no mercado.
MA: É isso. Obrigada aos nossos ouvintes por terem nos acompanhado até aqui. Na Argus, acompanhamos de perto os mercados de etanol e açúcar e logo voltaremos com mais atualizações.
Confira os demais episódios da série Falando de Mercado no seu agregador de podcasts e no site argusmedia.com.
Até a próxima.
MB: Tchau, tchau.