

Falando de Mercado: Queda de preços e aumento das importações de diesel no Brasil
- 27 de maio de 2025
- Market: Oil Products, Road Fuels
O mercado de diesel no Brasil repercute os cortes de preços pela Petrobras e a maior entrada de combustível importado da Rússia. Entenda o que move esse mercado acompanhando a conversa entre Marcos Mortari, especialista em diesel e editor associado do relatório Argus Brasil Combustíveis, e Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil.
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Transcript
Camila Fontana: Olá pessoal! Sejam bem-vindos ao Falando de Mercado, uma série de podcast semanais da Argus Media sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo.
Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta da redação da Argus no Brasil, e o assunto de hoje é o mercado de diesel, após sucessivos cortes de preços pela Petrobras e forte entrada de combustível importado.
Quem vai falar sobre esse mercado nessa discussão é o Marcos Mortari. Ele é especialista no mercado de diesel e editor associado do relatório Argus Brasil Combustíveis.
Marcos, a gente vai ter uma conversa mais aprofundada no decorrer do episódio, mas para situar os ouvintes que não acompanham esse mercado de perto, o que determina o consumo de diesel no país? Quais são as variáveis fundamentais para prever a demanda pelo combustível em determinado período?
Marcos Mortari: Oi Camila, obrigado pelo convite. É um prazer falar com você e com nosso ouvinte da Argus.
A gente costuma brincar que o consumo de diesel está muito relacionado ao PIB e se tem um combustível que move o PIB brasileiro, a gente poderia dizer que é o diesel.
O consumo de diesel tem uma correlação muito forte com o desempenho da economia de modo geral, mas também com o desempenho da safra, das exportações brasileiras, porque é o principal combustível usado no modal rodoviário, que é o nosso principal modal aqui no Brasil.
Mas também ele tem uma correlação grande com a dinâmica do transporte coletivo de ônibus nas grandes cidades e até mesmo no consumo de veículos leves, movidos a diesel. Claro que em uma medida menor do que essa questão logística maior no país.
CF: E você daria um panorama geral do que está acontecendo atualmente no mercado de diesel no Brasil?
MM: Claro. A gente tem duas componentes principais que estão mexendo muito com o mercado de diesel aqui.
A primeira, que é muito interessante, diz respeito ao preço do diesel importado, o valor para a importação e o preço praticado aqui. A gente tem visto uma janela de arbitragem muito menor. Ela está se fechando. E o que isso significa?
Isso significa que o diesel importado, diesel que a gente traz, que importadores trazem para o Brasil, está num preço próximo ao diesel praticado nacionalmente pela Petrobras, que é o principal vetor que traz essa ancoragem para os preços. A Petrobras é o principal player nesse mercado. Os preços são balizados de acordo com os preços praticados pela Petrobras.
Esse é um ponto bem importante que a gente está observando nas últimas semanas, mas outro também, que a gente já vem observando há mais tempo, é o fechamento na diferença de preços entre o diesel russo e o americano.
Essas duas são as principais origens do diesel importado pelo Brasil. A Rússia hoje responde por 70pc, praticamente, os Estados Unidos por cerca de 30pc do nosso diesel importado. E há muito tempo já o diesel russo vinha mais barato do que o americano. E é isso que fez com que o diesel russo conquistasse mais, uma fatia maior no mercado brasileiro.
Mas de umas semanas, de uns meses para cá, isso tem diminuído. Eles têm ficado cada vez mais próximos dos preços, algo que a gente não via há muito tempo.
CF: E você descreveu um quadro de arbitragem se fechando e também a gente tem uma outra questão, que é a expectativa de entrada de grande volume de combustível importado. Então, quais são as consequências desses dois fenômenos?
MM: Muito bem lembrado, Camila. A gente no mês de abril já teve um volume grande de diesel importado para o Brasil e para maio agora a gente também espera um volume muito elevado quando a gente observa os dados de fontes que a gente tem para monitorar o andamento dos navios, essa dinâmica toda de importação, o que que está esperado para vir, para chegar de navio nos portos brasileiros com diesel. Enfim, a gente tem uma expectativa muito grande de produto chegando.
E aí você tem alguns riscos, porque dois meses seguidos com uma importação muito alta, uma janela de arbitragem fechando, você tem um risco grande de sobreoferta de produto e ainda uma dificuldade do importador em repassar esse preço. Uma dificuldade cada vez maior, já que, enfim, a arbitragem está fechada e isso vai comprometer um pouco as margens deles.
A gente vai ter que ficar muito de olho nas próximas semanas, nos próximos meses, com essa dinâmica, essa relação de o fluxo para dentro do Brasil, como que as importadoras vão conseguir desovar esse produto, vender esse produto nacionalmente. E a dinâmica das próprias importações, tendo em vista que elas têm tancagens limitadas, enfim. Isso certamente vai afetar muito o mercado de diesel aqui no Brasil. Essa dinâmica de quanto de produto que está vindo e qual a capacidade de venda das importadoras em um ambiente de diferença menor e de menos espaço para margens dessas empresas e para repasse dos preços.
CF: E além desse quadro que você descreveu, a gente também tem que ficar muito de olho no que tem acontecido no mercado internacional, as questões geopolíticas que podem afetar os preços do diesel por aqui. Quais seriam os eventos cruciais para a gente ficar de olho?
MM: A gente sabe que boa parte do diesel que é consumido no Brasil é produzida aqui mesmo, mas tem uma fatia muito relevante que é a das importações.
Cerca de 30pc do diesel que a gente consome é importado. A gente já tem essa exposição natural e é um mercado muito globalizado, alguma coisa acontece em, do outro lado do mundo e isso reflete claramente nos preços aqui. Alguns fatores que podem mexer e que devem ser monitorados para quem acompanha de perto esse mercado são os desdobramentos da guerra comercial entre Estados Unidos e diversos países, principalmente a China.
Isso mexeu muito com os preços no começo do ano, principalmente, até agora, também tem mexido bastante. Agora que saiu recentemente um acordo com a China para suspender temporariamente aquelas tarifas recíprocas acima de 100pc. Isso mexe com as perspectivas de economistas, expectativas com relação ao desempenho da economia global e, por isso, também o consumo de diesel.
Os desdobramentos da guerra na Ucrânia também são muito importantes, porque a gente observa que tem um fluxo muito grande de diesel russo vindo para o Brasil e parte desse movimento, a Rússia começou a ganhar uma fatia relevante do mercado brasileiro justamente durante o período da guerra, em que a Rússia foi sendo alvo de sanções pelo resto do mundo, pelos Estados Unidos, enfim, pelas grandes nações no Ocidente.
Portas ficaram fechadas para produto russo, em grande medida, na Europa também, o que fez com que a Rússia buscasse outros mercados. E o Brasil foi um deles.
Então, se você tem uma mudança nessa dinâmica da guerra na Ucrânia, certamente isso afetará a disponibilidade de diesel aqui no Brasil. Isso é um fator bem importante. A gente também tem que monitorar as próprias dinâmicas no Oriente Médio, já que é uma região muito importante de produção de petróleo e derivados.
A gente também tem que acompanhar as decisões de aumento de produção da OPEP, algo mais recente, que tem mexido muito com o mercado também mais, potencialmente mais diesel disponível no mercado pode ser uma pressão para queda de preços em algum momento
E também para fechar a questão de manutenção de refinarias no Hemisfério Norte. Agora a gente tem visto algumas refinarias russas em manutenção. Esse um ponto importante que mexe com a oferta de diesel para o Brasil. E também as discussões sobre mandatos de mistura de biocombustíveis nos combustíveis fósseis nos Estados Unidos.
A gente está vendo essa discussão agora acontecendo. Se você tem uma maior mistura de biocombustível, biodiesel, por exemplo, no diesel, certamente diminui a proporção de diesel nessa mistura e você tem mais diesel disponível, teoricamente.
Basicamente, esses elementos são bastante importantes para quem quer acompanhar de perto esse mercado de diesel.
CF: E no mercado doméstico, no que a gente deve ficar de olho?
MM: No mercado doméstico, é impossível quem quiser acompanhar mais de perto os acontecimentos não observar o que acontece na Petrobras.
Petrobras é o grande player desse mercado. Como eu disse antes, os preços que a gente monitora na Argus, que são no mercado spot, o mercado à vista, eles são relacionados aos preços praticados pela Petrobras. Eu vou dar um exemplo.
Um dos portos que a gente acompanha as negociações é o Porto de Santos e os preços praticados por traders no mercado spot, muitas vezes as ofertas, enfim, são feitas em relação aos preços praticados pela Petrobras. Em Santos, por exemplo, a referência do lado da Petrobras é Paulínia.
É muito comum a gente conversar com o trader e ele fala “olha, eu estou na paridade com os preços da Petrobras”, “eu estou com um prêmio de R10 por metro cúbico em relação ao preço da Petrobras em Paulínia”, enfim.
Os preços da Petrobras, a política de preço, a forma como a Petrobras se posiciona no mercado, tem uma densidade, tem uma importância muito grande. As decisões de preço da companhia, se vai aumentar, se vai reduzir. Os leilões também. A Petrobras realiza seus próprios leilões, isso é muito importante.
A gente teve um leilão no dia 16 de maio de diesel S-10, de diesel S-500 e de gasolina, que é bastante relevante também para o mercado, para a gente monitorar demanda, para monitorar preço, para monitorar, enfim, quão aquecido está o mercado ou não. Dados de produção da Petrobras também são importantes. Então assim, Petrobras é um assunto-chave.
Mas para além da Petrobras, a gente tem outros pontos importantes que são monitorar a liquidez no mercado, como é que as negociações estão se dando no mercado spot, que é algo que a gente monitora diariamente aqui na Argus. A situação de tancagem dos principais participantes do mercado, que é, enfim, uma situação mais difícil.
Menor disponibilidade de tanque pode comprometer preço, porque o vendedor pode se ver numa situação em que ele está mais obrigado a vender mais rapidamente para liberar espaço também nas suas reservas. Enfim, isso é importante, e a própria dinâmica das importações que mexe com a oferta. Além das questões de demanda relacionadas a safra, a necessidade de escoamento de produção, enfim, todas as questões relacionadas à logística no país, que certamente impactam bastante o mercado de diesel.
CF: E você poderia explicar resumidamente como funciona a cobertura do mercado de diesel aqui na Argus?
MM: A gente tem dois grupos de indicadores aqui na Argus que a gente desenvolveu.
Basicamente, um deles acompanha o processo de importação de diesel. Esse mercado de diesel para trazer o produto aqui para o país. E aí a gente tem dois indicadores principais, um no Norte-Nordeste, outro no Sul-Sudeste e para cada região a gente tem um indicador com o produto russo e o produto não russo. Por que isso?
Porque a gente observava uma diferença grande que, como a gente disse, que está cada vez menor agora, mas que existe, de preços e de diferenciais, entre o produto russo e o não russo. Então a gente desenvolveu essa separação que permite a gente ter uma clareza ainda maior do mercado e monitorar todas essas dinâmicas, muito com a lupa. A gente consegue antecipar muitos movimentos de mercado com isso.
Só para complementar, ainda sobre esse mercado de importação de diesel. Como é que a gente divulga os nossos preços?
São preços semanais que a gente divulga em centavos de dólar por galão norte-americano em relação aos preços dos contratos futuros de ULSD, que é o diesel de baixo teor de enxofre, na Nymex, que é a bolsa de contratos futuros nos Estados Unidos.
A gente sempre usa o contrato de referência do mês seguinte e do próximo. São sempre dos dois meses próximos. Por exemplo, a gente está agora em maio, a gente está monitorando aquisições que provavelmente vão chegar muito mais em junho, talvez até em julho. E os contratos de referência são os contratos de junho e julho na Nymex, para a gente fazer esse diferencial que a gente acompanha.
CF: E também tem a cobertura diária.
MM: Isso. A gente tem a cobertura do diário que a gente já acompanha o produto nacionalizado, ele já foi importado, ele já passou por todos os trâmites alfandegários, ele está em negociação nos portos pelos importadores com distribuidores.
Esse indicador, ao contrário do outro, ele é diário. A gente monitora quatro portos principais aqui no Brasil. Na região Sul-Sudeste, são dois e dois também no Nordeste. Na região Sul-Sudeste, a gente tem o Porto de Santos e o Porto de Paranaguá. E os preços da Petrobras de referência são em Santos, os da refinaria de Paulínia, e em Paranaguá, os da refinaria de Araucária.
No Nordeste a gente tem duas coberturas, dois indicadores, um para cada porto, um para Suape, com referência ao terminal de Ipojuca e outro em Itaqui, o terminal de São Luiz.
São esses os principais indicadores que a gente tem aqui no mercado doméstico de diesel.
CF: Obrigada, Marcos. Obrigada aos nossos ouvintes. Nós aqui na Argus, claro, continuaremos acompanhando as movimentações do combustível que movimenta o PIB e também os fatores que impulsionam esse mercado, tanto aqui no Brasil quanto no exterior.
E você, confira os demais episódios da série Falando de Mercado no seu agregador de podcast e no site argusmedia.com. Até a próxima, pessoal!
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