• 10 de novembro de 2025
  • Market: Oil Products

O mundo está acelerando a utilização de combustível sustentável de aviação e desenvolvendo projetos para atender a essa demanda crescente. Companhias aéreas trabalham para reduzir emissões enquanto autoridades, inclusive na América Latina, reavaliam seus marcos regulatórios e mandatos de biocombustíveis. Camila Fontana, chefe adjunta da redação da Argus em São Paulo, recebe Josh Vence, vice-presidente de Operações e Desenvolvimento de Negócios com foco em SAF e biocombustíveis, e Lucas Boacnin, gerente de Desenvolvimento de Negócios com foco em transição energética, para discutir o mercado global de SAF, os avanços regionais e as referências dos preços Argus para o produto.

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Camila Fontana: O mundo está acelerando a utilização de combustível sustentável de aviação (SAF) e desenvolvendo projetos para atender a essa demanda crescente. Hoje nós vamos falar do mercado global de SAF, que é a sigla em inglês para esse combustível. Também vamos discutir os avanços da América Latina e como a Argus apoia a transparência e a formação de preços nesse segmento.

Eu sou Camilla Fontana, chefe adjunta da redação da Argus em São Paulo e os meus convidados são Josh Vence, ele é vice-presidente de Operações e Desenvolvimento de Negócios com foco em SAF e biocombustíveis, e também o Lucas Boacnin, gerente de Desenvolvimento de Negócios com foco em transição energética. Vamos começar com o Josh e uma visão geral. O que está acontecendo nos mercados de SAF ali de uma perspectiva global?

Josh Vence: Globalmente a adoção de SAF está acelerando. Na Europa, os mandatos de mistura estão se tornando mais rigorosos, os países estão caminhando para uma mistura de 2% de SAF até 2025, e as metas mais altas, até 2030. Nos Estados Unidos, os créditos fiscais sobre o Inflation Reduction Act incentivaram a produção, porém, sob a administração Trump, esses créditos estão sendo gradualmente eliminados.

O programa Corsia da ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional, na sigla em inglês) também está pressionando as companhias aéreas a reduzirem emissões, além de forçar governos, inclusive na América Latina, a reavaliarem seus marcos regulatórios, de legislações e mandatos de biocombustíveis. Um dos principais benchmarks é o preço Argus HEFA SAF SPK ARA, publicado no Argus Open Markets. Esse preço é a avaliação de SAF mais líquida globalmente, respaldada por um contrato futuro na ICE, o que adiciona transparência e oportunidade de hedge.

CF: Josh, além dos referenciais de preços, você pode falar um pouquinho sobre os mandatos de mistura de SAF na Europa e no Reino Unido?

JV: Na União Europeia, o Regulamento ReFuelEU Aviation estabelece uma trajetória clara: 2025, exigência de mistura de 2% de SAF; 2030, 6% de SAF, incluindo uma submeta de 0,7% para SAF sintético; a partir daí, acelera 20% até 2035; 70% até 2050. Mas, por enquanto, o foco está em atingir os 6% até 2030.

Agora, no Reino Unido, o mandato é ainda mais ambicioso: 2025, mistura de 2% de SAF; 2030, mistura de 10% de SAF. O Reino Unido também introduz uma obrigação separada para combustíveis power-to-liquid, a partir de 2028, com a meta de 3,5% até 2040. Esses mandatos visam garantir demanda e incentivar investimentos na capacidade de produção de SAF.

Ambas as regiões sinalizam forte apoio regulatório, e isso é essencial para escalar a oferta de SAF e reduzir as emissões de aviação. E são esses fundamentos de mercado que sustentam o benchmark de SAF da Argos na Europa.

CF: Você citou a Europa, Reino Unido, mas e a Ásia?

JV: A Ásia está avançando em ritmos diferentes, dependendo do país. Singapura se posicionou como um hub comercial de SAF e está desenvolvendo programas voluntários de mistura, enquanto o Japão anunciou planos para uma meta de 10% de SAF até 2030 em voos internacionais. A Coreia do Sul também está explorando mandatos e incentivos, e a China está investindo fortemente em desenvolvimento de matérias-primas e projetos pilotos de SAF, embora ainda não haja um mandato formal.

No geral, a Ásia está focada em construir cadeias de suprimento e infraestrutura primeiro. Os marcos regulatórios devem se tornar ainda mais rígidos nessa década.

CF: Antes de passar para o Lucas para a gente conversar sobre a América Latina, eu queria, Josh, que você falasse um pouquinho de Estados Unidos. Quais políticas públicas, ou programas, estão impulsionando esse crescimento do SAF?

JV: Os Estados Unidos são um dos mercados de SAF mais ativos globalmente, graças ao forte apoio regulatório. O Inflation Reduction Act introduziu créditos fiscais de até US$1,75 por galão de SAF, dependendo da redução de emissões no ciclo de vida. Isso impulsionou significativamente os investimentos.

O Blenders Tax Credit e programas estaduais, como California LCFS, também oferecem incentivos adicionais. A capacidade de produção está se expandindo rapidamente com vários projetos, como HEFA ou alcohol-to-jet, que estão em desenvolvimento. As companhias aéreas assinaram contratos de fornecimento de longo prazo e os Estados Unidos devem continuar sendo um dos principais motores de crescimento da oferta global de SAF até 2030.

CF: Lucas, agora sim, falaremos de América Latina, nossa região. Quais são as novidades por aqui?

Lucas Boacnin: Muito obrigado, Camila. Falando de América Latina, o progresso vai variar um pouco de acordo com o país. O Brasil acaba sendo líder nesse sentido, tendo sancionado a Lei do Combustível do Futuro em outubro de 2024, e tornando-se o primeiro país da América Latina a ter um mandato de SAF.

E como ficou esse mandato de SAF? O setor de aviação vai ter uma obrigação de reduzir a emissão dos gases de efeito estufa em 1% a partir de 2027 e até 10% em 2037. Se a gente trouxesse isso para parâmetros volumétricos, isso equivaleria a, mais ou menos, 1,5% em 2027 de um blend ou 15% em 2037, assumindo, claro, que esse SAF fosse baseado no óleo de soja.

Este ano, players do mercado brasileiro realizaram as primeiras importações de SAF aqui na América Latina e a Argus também lançou o primeiro preço de paridade de importação pelo SAF, colocado em Paranaguá. Isso vai oferecer um benchmark claro para essas negociações.

CF: Você pode falar um pouquinho da metodologia que a Argus desenvolveu para SAF?

LB: Sem dúvida, Camila. Esses preços são preços calculados da paridade de importação, tanto para o diesel renovável no Brasil e no Chile, quanto para o SAF no Brasil. Os cálculos basicamente mostram o valor do produto entregue nesses países, de acordo com o ponto de referência, que é a Costa do Golfo Americano.

Esse local foi considerado por conta de sua proximidade logística com a América Latina e porque a América Latina tem se tornado um grande polo de produção de diesel renovável e de SAF. Mas, além disso, é importante dizer que esse preço leva em consideração também qual é o mercado alternativo mais valioso ao qual esse produtor poderia estar destinando esse produto. No caso do diesel renovável, seria o mercado da Califórnia, e para o SAF, seria o mercado da Europa.

CF: País por país aqui na América Latina, o que está acontecendo de interessante, Lucas?

LB: Bom, a gente pode citar um pouco do que está acontecendo em cada um dos países aqui na América do Sul. No Chile, tem uma iniciativa chamada Vuelo Olimpio, que está promovendo uma adoção do SAF e tem algumas discussões sobre mandato lá também. No Uruguai, nós temos players de mercado explorando o coprocessamento e até projetos greenfield para a produção de SAF.

É importante dizer que no Cone Sul, como um todo, estão ocorrendo alguns atrasos de financiamento e isso tem atrasado um pouco os projetos. Agora, citando o México e a Argentina, a gente vê um movimento muito parecido com o Brasil, onde eles estão considerando implementar mandatos em conformidade com o que a ICAO tem determinado, mas também muito voltados para priorizar as principais cadeias de suprimento dos feedstocks que eles mais têm acesso — nesse caso, o óleo de soja. E na Colômbia, há algumas discussões iniciais sobre a utilização do SAF como parte de uma estratégia mais ampla do país de descarbonização.

CF: Como esses avanços aqui na América Latina se comparam com a Europa, Estados Unidos, Ásia?

LB: Bom, Camila, é importante dizer que a América Latina, tanto do ponto de vista de demanda obrigatória quanto voluntária, por biocombustíveis, principalmente os mais avançados, historicamente acabou ficando para trás do restante do mundo. Mas as medidas locais estão cada vez mais ganhando força e nós temos a expectativa de que vão surgir novos mandatos e mais demanda e oferta de produto nesses países que estão cada vez mais buscando uma redução na pegada de carbono. É importante dizer também que a discussão país a país depende um pouco.

Enquanto alguns países estão tendo uma visão mais estratégica para se tornar um hub de exportação de combustível, por exemplo, outros estão mais voltados para ser um hub de exportação de matérias primas, e alguns até de ambos. Então, acaba sendo caso a caso uma estratégia país a país.

CF: Voltar agora com o Josh, como a Argus apoia esse mercado de SAF?

JV: A Argus fornece os benchmarks de SAF mais confiáveis globalmente, incluindo os preços de SAF 100 nos Estados Unidos, incluindo a costa do Golfo Americano, Illinois e Costa Pacífica americana, SAF Singapura, preços de paridade de importação para a América Latina, conforme mencionado pelo Lucas, e o Argus Hefa SAF SPK ARA, que possui um contrato de futuro na ICE vinculado, ajudando os participantes do mercado a gerenciar seus riscos. Nosso objetivo é ajudar os participantes do mercado a navegarem decisões de preços, conformidade e investimentos com transparência.

CF: Então, recapitulando, mandatos globais de SAF estão se tornando mais rigorosos, América Latina está avançando, tendo o Brasil na liderança, e a Argus continua sendo a referência para preços de SAF no mundo todo. Obrigada, Josh. Obrigada, Lucas, e obrigada também aos nossos ouvintes. Para baixar o nosso último relatório sobre SAF, acesse argusmedia.com e nós nos vemos na próxima semana. Até lá!